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Liliana Alves
Dirigente Associativa 

Antes de iniciar esta redação, levei algum tempo a organizar no papel o ponto de partida da minha reflexão. A tarefa revelou-se mais complexa do que imaginava. Apesar de, à primeira vista, parecer um tema com respostas evidentes, a verdade é que ao tentar estruturar o meu pensamento, fui invadida por uma série de perplexidades. Comecei com ideias soltas, tópicos dispersos, e foi a partir daí que encontrei o impulso necessário para construir esta síntese reflexiva.


Importa, primeiramente, compreender que a Agenda 2030, aprovada em 2015 pela Assembleia Geral das Nações Unidas, está estruturada em 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). Entre estes, destaca-se o Objetivo 11, que serve de base a este artigo: “Tornar as cidades e os aglomerados urbanos mais inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis.”


Recorrendo à literatura Matan e Mcintosh (2015), defendem que as cidades são cada vez mais centros de inovação e evolução social, oferecendo melhores acessos a serviços, o que as torna espaços privilegiados para viver. Tornaram-se, ao longo do tempo, os motores decisivos do crescimento económico e lugares de oportunidade, interação cultural e prosperidade. Moreno (2024) propõe uma “cidade dos 15 minutos”, onde tudo aquilo de que necessitamos no dia a dia- trabalho, escola, comércio, saúde, lazer- esteja acessível a pé ou de bicicleta. Uma solução que conjuga bem-estar urbano, participação social e sustentabilidade ambiental.


Em contrapartida, Fonseca e Prata (2022) alertam que o desenvolvimento sustentável nas cidades é um dos maiores desafios do século XXI. O crescimento urbano, muitas vezes, desordenado tem gerado consequências sérias para o ambiente e as estratégias sustentáveis ficam frequentemente aquém do necessário, pois o poder económico tende a sobrepor-se aos problemas sociais e ambientais.


Vivemos hoje um tempo crucial para refletirmos sobre o impacto da atividade humana no ambiente e na qualidade de vida das populações. Os desafios urbanos não são apenas ambientais, mas também sociais e económicos que exigem uma mudança de paradigma.


As cidades inteligentes podem representar uma solução viável: um crescimento económico sustentado, que promova o progresso social e, ao mesmo tempo, reduza a poluição e preserve os recursos naturais. Mas é essencial que a inovação tecnológica seja guiada por valores éticos, e não por interesses comerciais. Devemos, pois, desenhar cidades tecnológicas, sim, mas também humanas, inclusivas e sustentáveis. O digital será
central na forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos, mas não pode agravar as desigualdades já existentes.


As cidades devem ser diversas e integradas, com participação ativa dos cidadãos e um urbanismo construído com as pessoas e para as pessoas (Jacobs,1961). Por sua vez, Bauman (2001) alerta para o sentimento de insegurança nas sociedades modernas, defendendo que comunidades coesas e participativas são uma resposta à fragilidade das relações atuais. Nesta linha de pensamento, considero realçar Hall e Pain (2006) com o conceito de policentricidade, a criação de redes territoriais interligadas, urbanas e rurais, que se complementem mutuamente, promovendo a coesão, a sustentabilidade e a inovação a partir da diversidade.


É de salientar que as cidades refletem as necessidades atuais e os padrões de vida modernos, sendo frequentemente privilegiadas em detrimento das zonas rurais. No entanto, acredito que o investimento no meio rural deve ser encarado como uma extensão estratégica das cidades, e não como espaços secundários. Nas zonas rurais, a verdadeira riqueza está nas redes comunitárias e na harmonia com a natureza, apostando em infraestruturas digitais, habitação, transportes públicos, serviços de saúde e educação descentralizados, permitiria revitalizar estas regiões e evitar o crescimento descontrolado da população urbana.


Ora, a inovação, por si só, não pode substituir as ligações comunitárias, o sentimento de identidade e de ligação ao território é um fator crucial para o bem-estar social. Por isso, é essencial promover redes locais de solidariedade, diálogo entre diferentes grupos sociais e etários, e valorizar a cultura e a identidade local. Só assim conseguiremos fortalecer a coesão social e criar comunidades mais resilientes.


É necessário transformar o sistema de dentro para fora, os decisores políticos devem alinhar-se com os compromissos internacionais de sustentabilidade, criando políticas que conciliem crescimento económico, justiça social e proteção ambiental. Deve-se adotar o modelo económico de Raworth (2017), que opera entre os limites sociais e os limites planetários- uma abordagem que assegura o bem-estar sem comprometer a capacidade ecológica da Terra. Só uma transformação profunda do nosso sistema económico e uma nova consciência coletiva poderão colocar o planeta acima do lucro e garantir um futuro verdadeiramente sustentável.


O futuro pertence às novas gerações, mas a sua construção começa hoje, nas decisões que tomamos, nas prioridades que estabelecemos e nos valores que escolhemos defender.

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